Por Alexandre Matias - Jornalismo arte desde 1995.

Quinta sensível

E depois da aula corre pro Porta Maldita que estava lotado para ver dois talentos em ascensão da música local tocar suas músicas delicadas com acompanhamentos sutis. Primeiro foi a vez de Luiza Villa fazer sua primeira apresentação solo, quando mostrou suas primeiras composições além de versões para músicas alheias, indo de Gilberto Gil à sua familiar Joni Mitchell, passando por uma versão deslumbrante para “If a Tree Falls in Love with a River”, de Lau Noah e Jacob Collier, quando abriu vozes com sua irmã Marina, e “Tristeza do Jeca”, que dividiu com o dono do segundo show da noite, Lucca Simões.

Assista a um trecho aqui.

Depois Lucca subiu ao palco para mostrar suas delicadas canções, conduzidas por sua voz suave e guitarra clara. Suas composições cresceram ainda mais com a bela banda que reuniu, com Eduarda Abreu nos teclados, Chico Bernardes na bateria e Lucas Gonçalves no baixo, partindo do folk e da MPB que impulsiona sua criação abraçando ao mesmo tempo tanto um rock setentista quanto uma pitada de jazz elétrico. Bem bonito.

Assista a um trecho aqui.

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Livros no Brasil

Na penúltima aula do curso Bibliografia da Música Brasileira que eu e Pérola estamos ministrando no Sesc Avenida Paulista, resolvemos falar sobre o porquê da imensa maioria de livros sobre o tema terem sido publicado nos últimos 25 anos e achamos inevitável falar sobre a história do livro e do mercado editorial no Brasil como um todo antes de falarmos sobre a produção sobre música brasileira do século 21. Voltamos aos tempos da chegada da coroa portuguesa ao Brasil, no início do século 19, como marco inicial deste mercado no país, algo que aconteceu muito depois do início de outros mercados latino-americanos (como o mexicano e o argentino) que datam do início da colonização da América, no século 16. Falamos sobre a criação das políticas públicas em relação ao livro desde o início do século 20 até o governo Fernando Henrique Cardoso, passando pela criação do Ministério da Cultura e pela expansão do mercado editorial e das grandes cadeias de livros na virada do século até chegar ao momento atual, em que tanto a introdução da internet e das tecnologias digitais neste mercado quanto a explosão da produção acadêmica nos primeiros governos Lula ajudaram a impulsionar o universo em que habitamos hoje, com editoras de nicho explorando temas como artistas e movimentos musicais que nunca foram esmiuçados no século 20, editoras de médio porte lançando coleções dedicadas à música e grandes editoras embarcando em projetos biográficos estimulados pelos próprios artistas. Na próxima aula encerramos o curso destacando as obras que consideramos primordiais para entender a música no Brasil.

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Um outro Taxidermia vindo aí


Foto: Gabriel Rolim (divulgação)

O Taxidermia está prestes a sair caminhando. Duo formado pelos baianos Jadsa e João Milet Meirelles, o grupo eletrônico já existia antes da pandemia mas só conseguiu dar seus primeiros passos fonográficos durante aquele período tenso de isolamento social. De lá pra cá, lançaram dois EPs e começaram a se apresentar ao vivo, mostrando que a apresentação ia muito além do formato Live PA que a distribuição de funções – vocalista e instrumentista toca com produtor de música eletrônica – parecia propor, explorando ambiências e sensações para além do repertório mais voltado pra pista de dança. Às vésperas de lançar seu primeiro álbum, Vera Cruz Island, ainda sem data de lançamento, eles começam a mostrar a nova fase nessa sexta-feira, quando lançam o primeiro single do disco, batizado de “Clarão Azul”, que eles mostram em primeira mão aqui no Trabalho Sujo, e fazem uma apresentação no projeto Stereo MIS, do Museu da Imagem e do Som, em São Paulo, a partir das 21h. Mais solar e tranquilo que as apresentações ao vivo do Taxidermia até então, o single ainda traz dois convidados: a vocalista sergipana Tori e o multiinstrumentista e produtor Pedro Bienemann. “‘Clarão Azul’ prepara o público para o universo do álbum”, explica João, que também é integrante do grupo BaianaSystem. “Trata sobre a ilha de Vera Cruz e nossa relação cheia de afetos por esse espaço. Estabelece o ambiente imagético que queremos trazer para nosso trabalho.” Jadsa completa: “A gente já vinha correndo atrás de soar um tanto mais orgânico, o que já parece fora da curva pelo fato de tocarmos música eletrônica e na maioria das vezes o timbre acompanhar o conceito, mas esse single tem muito uma necessidade natural de ser crua e o que mais nos inspirou foi o disco Flying Away, de 1997, da banda Smoke City”. E assim a dupla sai da primeira infância caminhando com passos firmes.

Ouça abaixo:  

Varanda suspensa


Foto: Ágatha Flora (Divulgação)

Queridinhos da casa, a banda de Juiz de Fora Varanda lança seu último trabalho antes de começar a produzir seu primeiro álbum ao fundir duas músicas num mesmo single. “Leva e Vem” ainda é da primeira fase da banda e é uma das músicas mais densas de seu repertório e ganhou uma faixa irmã que mantém a mesma atmosfera – e junto com “Vá e Não Volte” as duas músicas registram essa nova cara musical do grupo no mundo fonográfico. A vocalista Amélia do Carmo explica que as duas faixas apresentam esse “lado mais soturno do nosso som em contraponto com os últimos singles, estamos animados para explorar esse e outros novos caminhos de sonoridade no nosso álbum”. O baixista Augusto Vargas concorda, inclusive sobre a qualidade do som: “Acho que essas duas canções são as mais porradas, até agora, muita guitarra, muitas camadas de som. Bê e Mario conseguiram chegar em uma mix excelente, que foi muito bem finalizada com a master do Paulo, que vai produzir nosso disco!”, explica, se referindo aos outros dois integrantes da banda, o guitarrista Mario Lorenzi e o baterista Bernardo Merhy, que mixaram a faixa no estúdio da banda, o Estúdio LaDoBê, agora no mês passado, entregando que o baixista Paulo Emmery, que masterizou as duas faixas, é o produtor do primeiro disco da banda. O single duplo chega às plataformas à meia-noite desta quinta-feira, mas os mineiros fizeram mais uma preza aqui pro Trabalho Sujo e dá pra assistir ao clipe gravado na estrada em primeira mão.

Assista abaixo:  

É sobre

Ao propor um jogo musical, literário e cênico cujas regras não estavam definidas, Juliana Perdigão conduziu com seu clarinete e palavras um grupo formado pelos teclados de Chicão, pelo contrabaixo acústico de Ivan “Boi” Gomes e os eletrônicos do produtor Barulhista a um universo em que som e palavra fundiam-se numa mesma coisa. O espetáculo-experimento Fraga?, que aconteceu nesta terça-feiro no Centro da Terra, abriu com Perdigão lendo o início do poema-livro Odisséia Vácuo de Renato Negrão, cheio de pausas e lacunas, como se fosse música, para depois passear por seu próprio texto Dúvidas (base de seu disco de 2020) e depois por versões deste mesmo texto feitas pela autora através do Chatgpt. E enquanto ela lia os textos, os instrumentos musicais trabalhavam como se estivessem construindo uma base que ficava entre o ambient e o jazz de improviso ao mesmo tempo em que soavam como se estivessem falando – fossem sozinhos ou conversando entre si -, criando uma atmosfera de sonho surrealista que seduzia, hipnotizava e ninava o público para algum lugar entre o consciente e o inconsciente, algo que era reforçado pelas projeções sutis e sombrias de Filipe Franco. Foi mágico.

Assista a um trecho aqui.

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Juliana Perdigão: Fraga?

Enorme prazer em receber a querida Juliana Perdigão no palco do Centro da Terra. Mineira atualmente radicada na Alemanha, aproveitamos sua passagem pelo país para que ela nos propusesse uma apresentação e ela veio com um jogo – ou melhor, um jogo de perguntas sem respostas. Acompanhada por Ivan “Boi” Gomes no baixo acústico, Barulhista nos eletrônicos, Chicão no teclado e Filipe Franco nas projeções e luz, ela apresenta Fraga? nesta terça-feira e continua um trabalho com voz falada e clarinete que iniciou no disco Dúvidas, lançado no ano da pandemia. O espetáculo começa pontualmente às 20h e os ingressos podem ser comprados neste link.

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Lauryn Hill vem ao Brasil pro aniversário de 50 anos da Chic Show

Nossa senhora essa notícia! Não bastasse a célebre marca de meio século de existência da clássica festa black paulistana Chic Show ser comemorada em grande estilo com um festival em um estádio, o evento ainda contará com as presenças de Lauryn Hill, Wyclef Jean (dois terços dos Fugees, vem também Will I.Am!) e Yg Marley, Mano Brown, Jimmy “Bo” Horne, Criolo, Sandra Sá, Rael e os DJs Luciano, Preto Faria e Grandmaster Ney. A festa absurda acontece no dia 13 de julho no estádio do Palmeiras e os ingressos começam a ser vendidos na segunda que vem neste link.

Veja o flyer abaixo:  

E é claro que era o Let it Be

Os Beatles acabam de confirmar o rumor que plantaram nesta segunda, ao divulgar uma imagem que indicava que eles finalmente relançariam seu último filme, Let it Be. O filme de 1970 chega ao canal de streaming Disney+ no próximo dia 8. Lançado originalmente em abril daquele ano, Let it Be marca o fim definitivo de uma banda que já estava se esfacelando há um ano e meio, pois naquele mesmo mês Paul McCartney deu uma entrevista confirmando o fim dos Beatles (e aproveitando para divulgar seu primeiro disco solo, o ótimo McCartney). O tom amargo do documentário dirigido por Michael Lindsay-Hogg deu ao último ano da história da banda uma tristeza raivosa que é característica do final de relacionamentos, mas quando a Apple convidou Peter Jackson para remasterizar o filme e mexer com o material extra que havia sido gravado no período, o tom acridoce se dissipou quando o diretor neozelandês descobriu um material bem diferente do que havia sido imortalizado por Lindsay-Hogg, criando a série documental Get Back. “Os dois projetos se apoiam e melhoram um ao outro”, explicou Jackson em uma declaração publicada no site dos Beatles. “Let it Be é o clímax de Get Back, enquanto Get Back provê um contexto vital que falta em Let it Be. Michael Lindsay-Hogg foi infalivelmente prestativo e delicado enquanto estava fazendo Get Back e é mais do que correto que seu filme original seja a última palavra… Com imagem e som bem melhor do que quando foi lançado em 1970”. Mas me incomoda esse cartaz branco, pois todos sabemos que o original era preto, como a capa do disco…

Roda no palco

O título da noite era Samba no Tablado e Thiago França, Rômulo Froes e Rodrigo Campos foram literais ao colocar a mesa da roda de samba no palco do Centro da Terra, colocando cadeiras ao redor da mesa e puxando o público para participar da celebração junto com eles no palco – quem não quisesse poderia assisti-los das poltronas, assistindo aos poucos os outros integrantes da audiência cantarolar os sambas, bater palmas e acompanhar os la-la-laiás típicos deste formato. Os três donos da temporada dividiam os vocais com quatro convidadas, as já anunciadas Victória dos Santos, Fernanda Sangirardi e Bia Falleiros e a convidada surpresa Mari Tavares. Enquanto Thiago e Rodrigo puxavam harmonias com os cavaquinhos, Mari e Victória revezavam-se entre instrumentos de percussão enquanto o grupo desfilava clássicos eternos do samba (“Diz Que Fui Por Aí” do Zé Keti, “Ainda Mais” e “Argumento” do Paulinho da Viola, “Mora Na Filosofia” de Monsueto, “O Sol Nascerá” de Cartola e “Luz Negra” de Nelson Cavaquinho), reverenciavam as grandes damas Dona Ivone Lara, Clara Nunes, Beth Carvalho e Clementina de Jesus (“Na Linha do Mar”, “Na Hora Da Sede”, “Acreditar”, “Sonho Meu”. “Alguém Me Avisou” e “Vou Festejar”) e novos clássicos do pagode (“Malandro”, “Eu e Você Sempre” e “Tendência” de Jorge Aragão, “Será Que É Amor” de Arlindo Cruz, “Conselho” e “Trilha do Amor” do grupo Revelação e “Ainda É Tempo Pra Ser Feliz” de Zeca Pagodinho), além de passar por Gil e Caetano (“Desde Que o Samba É Samba”) e uma do próprio Campos (“Fim da Cidade”). A empolgação da roda teve de chegar ao fim devido ao horário do teatro e a falta de cerveja no palco, mas tinha tudo pra varar horas de samba.

Assista a um trecho aqui.

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Palavras de sabedoria

Que tal começar a semana com novidade dos Beatles? O grupo acaba de anunciar em suas redes e em seu site oficial um teaser que anuncia “finalmente”, mostrando uma imagem em branco com quatro molduras quadradas que, anuncia pra qualquer fã médio dos Beatles, a estrutura básica da capa do disco derradeiro da banda – Let it Be, de 1970 – que não por acaso traz a mesma estrutura no pôster no filme de mesmo nome lançado junto ao décimo terceiro álbum do grupo. Como o disco já faz parte da discografia em todos os formatos há eras, o foco fica no polêmico filme que encerrou a carreira do grupo. Dirigido por Michael Lindsay-Hogg, o filme encerrou a carreira da banda pop mais importante da história com um gosto amargo, precisamente pelo tom escolhido pelo diretor. Quando Peter Jackson foi convidado pela Disney para remasterizar o filme, antes da pandemia, ele ficou dividido justamente pelo teor pesado do filme original e imaginou que o material que não havia sido utilizado, que ele poderia trabalhar, seria ainda mais denso que o que foi lançado. Felizmente, Jackson aceitou a proposta e, como todo fã dos Beatles descobriu depois, ficou fascinado como a gravação teve seus momentos de união, criatividade e alegria, mesmo no meio das discussões que acabaram levando ao fim da banda – e esses extras deram origem ao mágico seriado Get Back. O teaser publicado nessa segunda – junto com um verso tirado da faixa que batiza o disco (“There will be an answer…”, “Haverá uma resposta”) – leva a crer que finalmente o filme será incluído na filmografia oficial da banda, já que só foi relançado pela banda depois de seu lançamento nos anos 80, quando surgiu em versões em VHS, Betamax e laserdisc em apenas alguns países. O filme foi remasterizado na época em que o grupo fez a versão definitiva de sua carreira na série Anthology, nos anos 90, mas apenas trechos foram utilizados. Seu relançamento digital e nos cinemas quase aconteceu na época do lançamento do disco Let it Be… Naked, em 2003, e depois em 2008, mas foi cancelado nas duas oportunidades. Ao que parece, agora vai – vamos torcer pra que chegue aos cinemas também!